"Amo como ama o amor.
Não conheço nenhuma outra razão para amar senão amar.
Que queres que te diga,
além de que te amo,
se o que quero dizer-te é que te amo?"
Fernando Pessoa
"Faz um pacto comigo"
Não ceder a pressões;
Não deixar de ser quem somos, Integridade;
Procurar a verdade;
Prazer, dar e receber, sempre!
Desejar, desejar, desejar;
Respeitar;
Acarinhar;
Sonhar, permitir sonhar;
Realizar sempre que possível;
Sinceridade sempre que possível;
Entrega por um segundo mais feliz!
Música do título, click, Adriana Calcanhoto, "Mais Feliz"
O Óbvio
Obviamente quero-te.
Como poderia não querer
esta cumplicidade que nos une.
Obviamente provoco-te.
Como poderia evitá-lo
se tu me tentas a cada passo.
Obviamente que me entrego.
Porquê ser dominadora
se essa entrega me liberta.
Obviamente sou tua.
Como poderia negá-lo
se o corpo o diz mais claramente do que as palavras.
Obviamente és livre.
Não se agrilhoam dragões
a menos que se queira que definhem.
Obviamente sou livre.
E a minha escolha é manifestação da minha vontade
por mais errada que ela possa parecer aos demais.
Tudo isto é óbvio.
Mas o mais importante
é que tudo isto
é certo.
Elegia dos Amantes Lúcidos
Na girândola das árvores (e não há quem as detenha)
Deixa de fora a tarde o vermelho que a tinge.
Se ao menos tu ficasses na pausa que desenha
O contorno lunar da noite que te finge!
Se ao menos eu gelasse uma corda do vento
para encontrar a forma exacta dum violino
Que fosse a sensibilidade deste pensamento
Com que a minha sombra vai pensando o meu destino
E não houvesse o sono dum telhado
Entre ter de haver eu e haver o tecto;
E a eternidade não estivesse ao lado
A colocar-nos nas costas as asas dum insecto
Meu amor, meu amor, teu gesto nasce
Para partir de ti e ser ao longe
A cor duma cidade que nos pasce
Como a ausência de deus pastando um monge
Ah, se uma súbita mão na hora a pique
Tangendo harpas geladas por segredos
Desprendesse uma aragem de repiques
Destes sinos parados pelo medo!
Mas só porque vieste fez-se tarde,
Ou é a vida que nasce já tardia
Como uma estrela que se acende e arde
Porque não cabe na rapidez do dia?
Nem homem nem mulher. Só a moeda antiga:
Uma inflação de deuses que não pode parar
Como um pássaro cego à nora da intriga
Que é a morte no centro connosco a circular.
Será o mesmo tempo que nos cabe?
Talvez sejas a raça prematura
Duma gota de orvalho que se há-de
Negar à minha sede desértica e futura.
Como o brilho dum sol partido ao meio
Damos luz pela nostalgia da metade.
Partes para ser gaivota no meu seio.
Mas não trazes no bico uma cidade.
Aqui pousou um pássaro de lume
Que deixou um voo subterrâneo
Na repetida vibração do gume
Que cada hora traz à lâmina do crânio.
Teus dedos num relógio como a picada duma abelha
A fabricar o mel da estação perdida!
Que quanto a primavera um rouxinol na telha
É toda a melodia que traz na unha a vida.
O navio tem dois extremos ermos:
Os cabelos para Vénus e os pés para Marte.
Mas a viagem é o mar com a terra a ver-nos.
E com lenços à vista ninguém parte.
Ah, se ao menos eu pudesse agora erguer-me
Como uma pedra pelas minhas mãos futuras
E ficasse para sempre a aquecer-me
Ao sol que cega efémeras criaturas!
Se soltasses as aves da rotina
E de um jorro de deuses abrisses a comporta
E reclinada em tua espádua genuína
Eu entrasse num céu sem ter que achar a porta!
Se tu viesses cavaleiro branco
Orvalhado pela manhã do meu instinto.
E ficasses a chamar-me como um canto
No porvir do nosso último recinto!
Se ficássemos espuma de Maio cor-de-rosa
Nas praias donde Maio se retira,
Enrolados nos panos duma paisagem silenciosa
Que fosse a pura sonoridade da ausência duma lira!
Ah, as sementes que te exigem em declive
Entre abismos onde nunca te despenhas
E esfumados voos em que te embebes e revives
O que de ti já pousou no cume das montanhas!
Inútil decifrarmos este oráculo de ave absorta
Na incontinência do voo que a abrasa.
Se houver um palácio sem porta, talvez seja a porta.
Se houver uma casa sem tecto, talvez seja a casa.
Natália Correia, in "Passaporte"
Eu amo-te sem saber como, ou quando, ou a partir de onde. Eu simplesmente amo-te, sem problemas ou orgulho: eu amo-te desta maneira porque não conheço qualquer outra forma de amar sem ser esta, onde não existe eu ou tu, tão intimamente que a tua mão sobre o meu peito é a minha mão, tão intimamente que quando adormeço os teus olhos fecham-se.
- Pablo Neruda, in "Cem Sonetos de Amor"
Kitty: Oh, you're reading a book?Laura Brown: Yeah.Kitty: What's this one about?Laura Brown: Oh, it's about this woman who's incredibly - well, she's a hostess and she's incredibly confident and she's going to give a party. And, maybe because she's confident, everyone thinks she's fine... but she isn't.
- Memorables quotes from "The Hours" (original title)
** As Horas (The Hours, em inglês) é um filme de longa-metragem anglo - americano de 2002, do género drama, dirigido por Stephen Daldry, baseado no livro As Horas, de Michael Cunningham.
Era uma vez uma pessoa que procurava a sabedoria. Tinham-lhe dito que para a atingir tinha sempre de aceitar e recusar ao mesmo tempo tudo o que lhe fosse oferecido, dito ou mostrado. Quando perguntava por onde era o melhor caminho e lhe diziam “é por ali” ela devia seguir imediatamente nesse sentido e depois no sentido contrário. Tendo assim percorrido todas as direcções indicadas e as não indicadas, sem mais caminhos a percorrer, sentou-se no chão e começou a chorar. Sem saber, tinha chegado.
- Ana Hatherly
O SEGREDO
por Belos e Malditos
Escondes um segredo, terrível segredo,
falas de Amor como quem foge fugindo.
Os corpo nus como deuses em terra esculpidos
danças ao som de flautas, envolta em brancos mantos.
rodeiam-te as sombras de um qualquer amante, orgasmos.
Orgasmos desenhados em sonhos de amante a quem chamas, chamando.
nome que não te cabe na boca, desejo que te alimenta o corpo. Fogo.
Viagem na verdade a que chamas ilusória. Rodeiam-te. Cercam-te.
és a mulher feita à semelhança dos que te vêem. não és tu. Tu.
Descobres num cálido Novembro a verdade sobre o Outro. Ele.
ele mesmo ele, o que esperas, o que apontas, a alma. O.
Tu comigo e eu contigo. O encontro. O redigir título.
de novo uma bela criação de um homem e uma mulher.
Juntos, tu comigo, eu contigo. Ele. Ela. Tu. Eu.
http://www.facebook.com/notes/belos-e-malditos/o-segredo/
fábula do fundo dos teus olhos
sabes, houve um tempo em que os teus olhos eram todo o meu mar
olhava para o fundo dos teus olhos e nunca via o que não podia ser
o que busco nestas águas e sei não estar escrito em cartas de marear
o brilho do sol sobre o salpico de espuma no vento que enfuna a vela
olhava para o fundo dos teus olhos e apenas via o que não podia ter
um mastro erguido contra a solidão na breve leveza da âncora içada
mas ontem olhei para os teus olhos e não vi senão o fundo dos meus
- josé luís
in http://poediapoedia.blogspot.com/
Necrológio dos Desiludidos do Amor
Os desiludidos do amor
estão desfechando tiros no peito.
Do meu quarto ouço a fuzilaria.
As amadas torcem-se de gozo.
Oh quanta matéria para os jornais.
Desiludidos mas fotografados,
escreveram cartas explicativas,
tomaram todas as providências
para o remorso das amadas.
Pum pum pum adeus, enjoada.
Eu vou, tu ficas, mas nos veremos
seja no claro céu ou turvo inferno.
Os médicos estão fazendo a autópsia
dos desiludidos que se mataram.
Que grandes corações eles possuíam.
Vísceras imensas, tripas sentimentais
e um estômago cheio de poesia...
Agora vamos para o cemitério
levar os corpos dos desiludidos
encaixotados competentemente
(paixões de primeira e de segunda classe).
Os desiludidos seguem iludidos,
sem coração, sem tripas, sem amor.
Única fortuna, os seus dentes de ouro
não servirão de lastro financeiro
e cobertos de terra perderão o brilho
enquanto as amadas dançarão um samba
bravo, violento, sobre a tumba deles.
- Carlos Drummond de Andrade, in 'Brejo das Almas'